Centenas de
fiéis de Bauru (SP) lotaram a igreja na manhã deste domingo (28) para assistir
à missa de despedida do padre que se afastou de suas funções após declarações
de apoio aos homossexuais.
Conhecido por
contestar os princípios morais conservadores da Igreja Católica, Roberto Francisco
Daniel, 48, conhecido como padre Beto, havia recebido um prazo do bispo
diocesano, Dom Caetano Ferrari, 70, para se retratar e "confessar o
erro" cometido em declarações divulgadas na internet.
Em um vídeo
publicado no site Youtube, o padre admitiu a possibilidade de existir amor
entre pessoas do mesmo sexo, inclusive por parte de bissexuais que mantêm
casamentos heterossexuais. Ele também questionou dogmas da Igreja.
Ontem, dois dias
antes do prazo estabelecido pelo bispo para a retratação, padre Beto anunciou
que iria se afastar de suas funções religiosas e convocou a missa de despedida
para hoje.
Na missa, o
padre falou sobre amor e coerência e afirmou que para "Jesus Cristo não
existia preconceito".
"Jesus
amava os seres humanos independentemente da condição social, da raça e da
sexualidade", disse o religioso.
A missa de
despedida lotou a Igreja Santo Antônio, no Jardim Bela Vista, bairro
tradicional de Bauru.
Em torno de mil
pessoas ocuparam os bancos e ficaram em pé nas laterais.
O padre foi
aplaudido de pé no final da missa e aclamado quando percorreu o corredor de
saída da igreja pela última vez. Muitos fiéis choraram e, em seguida, formaram
fila para cumprimentá-lo na porta.
Um dos mais
emocionados era o pai de santo umbandista Ricardo Barreira, que assistiu à
celebração vestido de branco e chorou muito.
"Não sou
católico, mas o padre Beto sempre me representou. Agora mais ainda",
disse. O umbandista recebeu o apoio do padre quando disputou a eleição para
vereador.
Beto vai entregar
seu pedido de "desligamento do exercício dos ministérios sacerdotais"
nesta segunda-feira para o bispo. Ele garantiu não ter planos para o futuro,
mas disse que poderá se reunir com seus seguidores para sessões de orações.
Procurado pela
reportagem, o bispo preferiu esperar o recebimento do pedido para comentar a
decisão.
ESTILO
Padre Beto
sempre chamou a atenção dos católicos da cidade pelo estilo diferente dos
religiosos tradicionais.
Usa roupas com
estampas "roqueiras" e com a imagem do guerrilheiro comunista Che
Guevara. Usa piercing, anéis e frequenta choperias. Nas missas, no entanto,
usava as vestimentas tradicionais e seguiu todos os rituais católicos.
Seus sermões
atraiam os fiéis em razão dos questionamentos sociais, políticos e morais.
As últimas
declarações polêmicas do padre provocaram protestos de católicos tradicionais
da comunidade de Bauru.
Por outro lado,
a reprimenda do bispo, que considerava padre Beto um "filho amado, mas
rebelde" gerou manifestações de apoio e provocou comoção entre os
admiradores.
Ao explicar sua
decisão de se afastar da igreja, disse que se trata de "um momento que faz
parte de sua caminhada".
"Pensei em
pedir perdão. Mas tudo que falei é bem pensado. Posso estar errado, mas o dia
em que admitir será porque conclui isso mesmo. Senão seria hipocrisia",
afirmou.
Disse ainda que
é importante "dormir bem porque foi coerente" e que assim as pessoas
vão percebê-lo "como homem de Deus".
Integrante do
grupo de liturgia da Igreja Santo Antônio, Michele Dias fez uma homenagem na
despedida.
Disse que se
"curou" de uma síndrome do pânico após palestra em que Beto falou sobre a
importância de enfrentar os medos.
A missa reuniu
católicos de todas as gerações. O casal formado por Giovani e Luzia Dermengi,
de 77 e 70 anos, respectivamente, mora em outra região da cidade, mas tinha o
hábito de frequentar as missas do padre Beto.
"Ele foi um
renovador e a igreja precisa disso", afirmou Luzia.
O arquiteto
Fábio Said, 30, virou amigo do religioso e diz que ele levou muitos jovens para
a igreja, por falar diretamente com seus fiéis e dar conselhos que às vezes até
irritavam, mas depois eram compreendidos.
"E agora? A
fé continua, mas é difícil", disse sobre a despedida.
Aos 6 anos,
Pedro Motta Popoff não frequenta a missa todos os finais de semana. Neste
domingo foi acompanhar a mãe, Carla Motta, que declarou estar na igreja por um
ato de cidadania e apoio ao padre.
Pedro ficou na
fila da despedida e deu de presente a Beto um churro comprado na porta da
igreja. Depois disso, Beto cumprimentou os demais fiéis com o presente do
menino nas mãos.
Fonte: Folha de São Paulo
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